Certa vez, o economista Edmar Bacha empregou o neologismo Belíndia para descrever um Brasil meio Bélgica e meio Índia. Hoje, no que diz respeito à indústria de software, seria ótimo que o Brasil fosse Índia por completo. À margem da tragédia das ondas gigantes que assolou o país em dezembro e dos séculos de atraso tecnológico da vasta maioria da população rural, a Índia terá exportado ao final de 2005 a fantástica quantia de US$ 16,3 bilhões apenas no setor de software, com um crescimento de 32% com relação ao ano anterior. Aqui no Brasil, exportamos uma média de US$ 100 milhões por ano no mesmo segmento de mercado. Por quanto tempo teremos que conviver com esse abismo numérico ?
A Carnegie Mellon University (EUA) e Sant'Anna School of Advanced Studies (Itália) fizeram um abrangente estudo sobre a globalização da indústria de software e os seus efeitos em países desenvolvidos e em desenvolvimento. A comparação dos cases da Irlanda, Israel e Índia (os chamados 3 I's) e as experiências na China e no Brasil mostram um interessante paralelo no mercado de software desses países.
Existe uma considerável diferença nos padrões de crescimento da indústria na Irlanda, Israel e Índia com relação à China e Brasil. A exportação como proporção das vendas totais somam porcentagens exponencialmente maiores nos 3 I's. Na China, esse índice passou de 5% em 1999 para 11% em 2002, número ainda baixo para que haja alguma aproximação no ranking de potências da indústria de software. O Brasil também apresentou certo crescimento, da mesma forma insuficiente para equiparar nosso país com as atuais lideranças do mercado internacional. Um dado importante, segundo o estudo, é o de que o crescimento das exportações de inteligência está atrelado ao surgimento de competências estimuladas pelo mercado interno. Assim, clientes e cases nacionais estimulam os desenvolvedores a oferecer soluções semelhantes fora do seu país de origem.
Não se pode culpar o empresariado nacional pela carência de exportações em software. Na verdade, o mercado nacional esteve por muitos anos carente de soluções profissionais na área de software. Nos últimos anos, a demanda interna por serviços e produtos no setor era tão alta que acabou consumindo todo o tempo e orçamento dos desenvolvedores e prestadores de serviços. Com o crescimento e principalmente com o amadurecimento da indústria de software do Brasil, a tendência é que essa balança comece a mudar muito em breve. A nova política industrial do governo Lula deveria ser um estímulo considerável para essa mudança. Ainda não foi, então temos que lutar para que até o final do mandato do atual presidente a PITCE (Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior) possa efetivamente trazer resultados para o setor de software do Brasil.
Governo e empresários devem trabalhar juntos em programas de desenvolvimento da indústria de software e sua permanente capacitação para a exportação, com foco na terceirização (como o modelo adotado pela Índia). Temos plena capacidade de competir com os 3 I's, pois temos talentos humanos e capacidade empreendedora para isso. Somente o mercado dos EUA (país que, aliás, segue reinando sozinho na liderança da indústria global de software) tem potencial para cerca de US$ 70 bilhões em negócios. Será que não iremos comer nossa parte nesse bolo?