É bastante comum ocorrer em multinacionais a implementação de projetos de TI (Tecnologia da Informação) padronizados – as soluções que serão utilizadas em todas as subsidiárias da empresa. Vê-se atualmente que elas utilizam os mesmos sistemas de informação, o que facilita a gestão corporativa da organização. Esses projetos demandam a participação de profissionais tanto da matriz como das subsidiárias. São pessoas que têm de vencer as barreiras da distância física, idioma, diferenças culturais, fuso horário e características da cultura de cada país.
Com o atual estágio da tecnologia e as ferramentas disponíveis, as viagens internacionais, com significativo dispêndio de tempo e custos, deixaram de ser um fator restritivo para esses projetos. Por meio da Internet, videoconferência e recursos de telefonia (como conferência para grupos), a presença física das equipes de projeto deixou de ser uma obrigatoriedade. Apesar da aparente facilidade oferecida pelo estágio tecnológico, existem desafios intrínsecos que precisam ser observados antes de se iniciar um projeto dessa natureza.
Depois da confirmação do patrocinador local do projeto, o primeiro desafio a ser superado é a sua abrangência, porque, se for decidido pela matriz que ele atingirá todas ou a maioria das subsidiárias, é imprescindível que um representante de cada filial esteja representado durante a definição do escopo. As particularidades de cada país devem ser discutidas antes do início da implementação, a fim de se evitar desgastes políticos internos e retrabalhos.
Escolher a equipe do projeto é o segundo desafio, tanto em termos de quantificação (número de profissionais, skills e habilidades necessárias) como de identificação dos recursos. Deve-se verificar cuidadosamente se há recursos nos locais de implementação, bem como sua disponibilidade no prazo previsto. A ausência ou a não disponibilidade de recursos locais certamente implicará em custos de deslocamento e hospedagem de profissionais da matriz ou de subsidiárias próximas no local de implementação. Neste caso, a obtenção do visto de entrada é mais um fator a ser considerado.
O terceiro desafio é superar as quatro modalidades de barreiras:
- Culturais: É importante que, ao se definir o escopo do projeto, sejam consideradas as características culturais de cada país em relação ao que será implementado. Dependendo da sua natureza, poderão surgir problemas causados por simples conflitos culturais, como o horário de trabalho. Na Itália, por exemplo, as pessoas costumam almoçar durante mais tempo do que os americanos; no México, é comum o horário dessa refeição se iniciar por volta das duas da tarde. Essas características podem se transformar em restrições para se agendar uma reunião por videoconferência ou mesmo por telefone.
- Lingüísticas: Um projeto multinacional deve definir uma língua comum para comunicação entre as equipes envolvidas. Se a língua definida for o inglês ou o espanhol, deve-se garantir que os profissionais que trocarão informações consigam ler, escrever e falar esse idioma. Pode acontecer de uma tradução mal feita causar um problema na definição de um novo procedimento ou no estabelecimento de uma regra de negócio, por exemplo.
- Legais: Cada país possui seu próprio conjunto de leis municipais, estaduais e federais. O projeto multinacional que não considerar a existência de grandes diferenças entre as leis poderá ter um sério problema na sua implementação. No Brasil, a legislação fiscal costuma sofrer constantes alterações, o que afeta os projetos de TI que envolvem impostos. É por esta razão que os sistemas devem conter o maior número possível de parametrizações para facilitar futuras manutenções.
- Tecnológicas: Apesar do avanço da tecnologia, isso não significa que todos os países onde o projeto será implementado estão no mesmo estágio de evolução. Ao se considerar a Internet como meio para troca de arquivos durante o projeto, deve-se verificar se o país possui um sistema de rede confiável, com a velocidade que se espera e os padrões de segurança exigidos.
Uma vez considerados o escopo, a equipe de projeto e as quatro barreiras, o projeto terá elevada probabilidade de obter sucesso. Ainda há outros benefícios intangíveis quando são utilizadas equipes multinacionais: a ampliação da visão crítica do projeto, que permite analisar melhor os pontos fortes, vulnerabilidades e riscos; um maior entendimento da cultura de outros países; a visão ampliada dos problemas locais pela ótica de um profissional que vive nesse país; e a possibilidade de oportunidades de trabalho fora de seu país de origem, motivando o profissional no seu desenvolvimento profissional e pessoal.
Se por um lado um projeto internacional visa padronizar a operação da organização em vários países, na tentativa de tornar as subsidiárias similares e integrantes do universo corporativo, por outro as diferenças devem ser não só respeitadas, mas sobretudo endereçadas com ações concretas e reais. A efetividade dessas ações será medida pelo sucesso ou fracasso do projeto.
* Sergio Machado é gerente de Projetos da Unisys Brasil, responsável pela implementação e suporte do CRM (Siebel) da empresa na América Latina, e atua como Green Belt no programa Six Sigma. É mestre em Administração de Empresas e professor da Fundação Getúlio Vargas (RJ)