Dias atrás li num site uma nota que me chamou atenção. Uma empresa da área da comunicação afirmava em letras “garrafais” que comemorava “cinco anos sem retrabalho”. No corpo da nota algo como “sem cometer erros na execução de tarefas para seus clientes”.

Bem, diante desta afirmativa, uma pessoa que tenha mais vivência empresarial poderá não nutrir grande simpatia pelo tom usado, e encarar os fatos da seguinte maneira: ou desacredita do método de medida ou, munido de um olhar publicitário, supõe que o caso tenha sido tratado como mero artifício da retórica comercial. Destas retóricas mercadológicas que, normalmente exageram na dose de otimismo.

A segunda opção, a meu ver, é menos problemática. Por diversas razões que não cabem esmiuçar no momento, porque desejo colocar em evidência outras questões. Desejo colocar em evidência as lembranças que esta nota resgatou em minha memória.

Lembrei que nas aulas de Medidas Elétricas, no Colégio Técnico Industrial da Universidade Federal de Santa Maria, onde descobri que em qualquer tipo de medição sempre haverá um erro de medida, por mais preciso que seja o aparelho usado. Nenhuma medida consegue ser absoluta!

A segunda lembrança, foi da cadeira de Eletrotécnica ministrada pelo professor Claudião. Descobri com ele que, qualquer isolante elétrico pode se transformar em condutor elétrico algum dia. Só depende da quantidade de energia que se aplica sobre ele. Por exemplo, não levamos choque ao permanecermos próximos às tomadas elétricas de nossas casas, mas sabemos do perigo que corremos ao permanecermos em pé num campo aberto, em dia de tempestade.

De uma hora pra outra o ar, até então isolante, passa a conduzir eletricidade, e um raio pode nos atingir em cheio. Essa mudança de estado acontece no exato instante que a tensão elétrica ultrapassa o ponto de resistência do ar.  Ali nasce a fagulha fatal.

Com estas duas lições descobri que o mundo não era absoluto, e este conhecimento me ajudou a formar o conceito do sistema produtivo que carrego junto comigo hoje. 

Quem trabalha em projetos, com prazos apertados, tarefas complexas, pressões por produtividade tem a sensação parecida com esta que acabo de descrever; sente-se como se estivesse num campo aberto, em dia de tempestade, totalmente entregue às intempéries, próximo do rompimento da resistência emocional das equipes. Isso é assustador!

Devido à necessidade de urgência da cadeia produtiva moderna, as pessoas que ocupam posições de liderança sonham com ferramentas que ajudem a medir esta instabilidade e calcular os riscos a que estão expostas.

Na maioria das vezes, esse cálculo proporciona maior segurança ao corrigir rotas que não estejam respondendo satisfatoriamente as expectativas da corporação.  Mas é preciso ter cuidado ao medir o desempenho das equipes, a fim de revelar sua produtividade. Podemos cair no erro de superestimar a precisão das medidas efetuadas e comprometer o resultado da equação. A questão que surge neste caso é, quanto de precisão se espera e, em que medida este cálculo reflete a realidade?

Particularmente não entendo a produção como um processo circular e repetitivo, muito menos estático. A imagem que faço da produção é uma espiral ascendente ou descendente, dependendo do impacto que as variáveis ambientais exercem sobre a corporação. Esta “espiralidade” torna o cálculo da repetibilidade muito dispendioso, e a estabilidade do sistema quase um mito.

Por este motivo, dificilmente empresas que atinjam a excelência produtiva, como a mencionada na nota, permaneçam tanto tempo neste estado, sem que esforços gigantescos sejam aplicados ininterruptamente na melhoria dos processos para manter o equilíbrio.

Outro infortúnio do desejo de exatidão é a carga excessiva sobre os projetos medidos. Por conta da coleta dos dados e dos padrões de comportamento, as atividades podem tornarem-se burocráticas  e engessadas. Com o intuito de tornar o ambiente controlável, corre-se o risco de baixar a produtividade e perder-se em infinitos processos de acompanhamento, que podem revelar-se inúteis com o passar do tempo.

Quando pensamos em melhoria contínua o módulo do cálculo deveria sempre ser positivo. Mas a única constante que temos é a variação do ambiente. Nada garante que, ao dar a volta completa na espiral de tempo enquanto navegamos quase que aleatoriamente por entre variáveis internas e externas, a resultante aponte para cima.

Diante da proposição afirmativa e quase positivista da nota, ao sustentar a margem zero de erro, não resisto em perguntar. Qual o índice de precisão considerado nesta medição?  Mais outra curiosidade se aviva em meu espírito no momento, tem consciência este empresário, por acaso, que a homeostase (leia-se estabilidade prolongada) é o mesmo que a morte de um sistema?

É preciso ter cuidado ao elevar o índice de energia aplicada à excelência empresarial, sob pena de uma fagulha de incredulidade chamuscar a opinião de quem enxergas as coisas com olhos de  consumidor ou de cliente. Como já dizia uma velha máxima do Marketing: “nada mais eficiente para destruir um mau produto do que uma ótima propaganda”.

* Liandro J. Bulegon é um dos sócios da Aquasoft, parceria da Borland no Rio Grande do Sul.