Nos dias atuais, a qualidade é um conceito de extrema importância para as organizações de uma forma geral. A melhoria contínua da qualidade é um dos maiores desafios a serem enfrentados pelas empresas, especialmente as que desejam conquistar novos mercados.

O processo de produção de software constitui-se de uma série de etapas que visam atender os requisitos de um cliente, levando-se em consideração os prazos e os custos da entrega de um produto de qualidade aceitável. Porém, ao longo das décadas verificou-se que é impraticável atender a todos estes objetivos sem a devida organização dos processos e conseqüente maturidade de uma organização. Principalmente quanto à disciplina e gerenciamento em nível básico, visando à  melhoria continuada de todas as etapas da produção de software.

O processo de preparação de uma empresa para a obtenção de uma certificação de qualidade é bastante longo e complexo. Por causa destas características é que o planejamento das atividades necessárias deve ser valorizado pelos responsáveis pela área de qualidade das organizações.

Não é nenhuma novidade que o planejamento é um ponto nevrálgico no processo de certificação, porém existe uma série de outros fatores que influenciam diretamente no sucesso das iniciativas de qualidade nas organizações.

Neste artigo, pretende-se mostrar as lições aprendidas em diferentes processos de implementação de modelos de qualidade em empresas desenvolvedoras de software.

Boas práticas para um programa de qualidade
Antes de dar o primeiro passo, as empresas que pretendem realizar uma implementação de um programa de qualidade devem realizar um planejamento, levantando quais são os objetivos da organização com a obtenção deste certificado de qualidade.

Além destes objetivos específicos, é importante levantar as demais metas do planejamento estratégico da empresa, a fim de alinhar o programa de qualidade para que o mesmo possa beneficiar a organização e proporcionar indicadores de sucesso.

Abaixo serão apresentadas as lições aprendidas divididas em três tópicos principais: Programa de Qualidade e GMP, Comunicação e Apoio da Alta Direção.
 
Questões relativas ao programa de qualidade e GMP
Depois de planejados os objetivos, é necessário focar na equipe que forma o Grupo de Melhoria de Processos da organização (GMP). Este deve ter dedicação exclusiva às questões relacionadas ao processo.

As atividades de processo, tais como: definição, treinamento, auditoria, atendimento aos usuários do processo, entre outras, são complexas e extenuantes.

Para isto, um colaborador que divida estas atividades com outras questões que não estão diretamente relacionadas não conseguirá ser produtivo, nem atender ao programa de qualidade com eficiência. Todos na equipe devem estar comprometidos com os objetivos de processo estabelecidos.

Devido à variedade e singularidade das atividades de processo, é  interessante que ocorra uma divisão clara de responsabilidades entre os membros do GMP, evitando assim atividades sobrepostas e uma possível confusão entre os seus integrantes.

A divisão de responsabilidades permite que sejam identificadas mais facilmente as origens de possíveis problemas e torna o monitoramento da situação do processo mais simples.

É necessário realizar um trabalho forte e pontual com GMP, conscientizando o grupo de que o processo sempre pode ser “melhor” do que o atual.

Por melhoria de processo entenda-se: simplificação e automatização de atividades, eliminação ou agrupamento de artefatos e revisão da necessidade de etapas.

Isto não significa que o processo precise mudar a todo instante, mas que se crie uma espécie de backlog que seja revisado em uma freqüência estabelecida pelos participantes e executantes do processo.

Para este backlog funcionar corretamente, deve conter as idéias da equipe de processos (GMP), bem como, todas as contribuições possíveis dos usuários do processo.

As implementações de programas de qualidade têm mostrado que tratá-las como projetos reais, com planejamento, monitoramento, definição de marcos, controle de custos e um cronograma pré-estabelecido é uma boa prática a ser seguida, além de permitir aos envolvidos enxergar o trabalho realizado e o que ainda resta para o alcance dos objetivos.

É importante salientar que o coordenador do GMP deve ter experiência ou facilidade no gerenciamento de pessoas e principalmente no gerenciamento de conflitos. Esta pessoa deve ter um perfil motivador e que tenha sensibilidade para orientar os membros da organização na realização de ações que permitam superar as dificuldades que certamente surgirão no decorrer do programa.

Mesmo que os componentes do GMP possuam qualificação suficiente para a implementação, a ajuda externa, através de consultorias, avaliações e diagnósticos, é essencial para obter uma visão “fora da caixa” do programa de qualidade e corrigir eventuais erros no traçado da rota em busca da qualidade.

Questões relativas à comunicação
Um GMP costuma ser alvo de muita beligerância nas organizações, pois interferem diretamente no modo de trabalhar das pessoas.

Uma sugestão é identificar e propagandear os benefícios que a utilização do processo pode trazer para todos. Também faz parte assumir quando partes do processo não estão boas ou adequadas e comprometer-se em revisá-lo e melhorá-lo.

O planejamento de comunicação interna é um fator muito importante em um programa de qualidade. O processo deve ter divulgação, material de apoio, campanhas, atividades de treinamento e participação da alta direção (Sponsor) e do GMP.

Deve-se tentar vender o processo dentro da empresa como se vende os próprios produtos de softwares para os clientes.

Para isto, é importante conhecer a cultura organizacional para poder definir qual será a forma de divulgação. Campanhas bem-humoradas têm se mostrado eficientes ao suavizarem a imagem fria e inflexível que os processos possuem.

É essencial recompensar os envolvidos. Não apenas ao atingir objetivos, mas também pela participação. Pequenas recompensas, como elogios, reconhecimento em público, reuniões com coffee breaks são motivadores e aumentam o comprometimento da equipe. É impressionante como pequenas coisas fazem a diferença em um projeto tão longo e complexo.

A experiência mostrou a importância de disseminar o conhecimento a respeito dos modelos e implementação de processos de software na organização. Quando os colaboradores possuem este conhecimento, torna-se mais fácil o treinamento, a reação negativa as mudanças será menor e os feedbacks serão mais qualificados.

Questões relativas ao apoio da direção
Os executivos da organização devem estar convencidos dos benefícios que um programa de qualidade pode trazer e de que os resultados podem demorar alguns ciclos de execução para serem alcançados. É claro que todos os níveis organizacionais devem estar comprometidos, mas a hierarquia superior deve estar alinhada e dedicada a apoiar as atividades do GMP.

Um programa de qualidade implicará em mudanças na cultura da empresa que nem sempre serão simples de efetuar. Cabe aos principais executivos compreenderem isto e apoiar o projeto. Um programa de qualidade não deve ser encarado como um carimbo atestando a qualidade e sim como uma mudança na forma de atuação da empresa.

O suporte financeiro é fundamental para a implementação de um programa de qualidade em uma organização, pois estes não são baratos e os resultados não aparecem de uma hora para outra.

Entre os altos custos, está o próprio GMP, alocação de pessoas em atividades não vinculadas a projetos externos, materiais de apoio e de divulgação, treinamento externos e aquisição de ferramentas. Desde o início do programa deve-se ter bem claro e estabelecido pela alta direção qual o orçamento que o GMP terá a disposição. É importante vender o programa de qualidade como um investimento com retorno a médio/longo prazo.
 
A busca pela qualidade não é simples, mas está longe de ser impossível. É um trabalho de melhoria contínua com resultados interessantes para todos os stakeholders da organização. A empresa que deseja qualificar seu processo de desenvolvimento de software deve estar ciente de que não será mais a mesma, que muita coisa pode mudar e que algumas verdades absolutas poderão deixar de existir.

Por envolver toda a organização, um programa de qualidade afeta e é  afetado por diversos fatores. Este artigo foi escrito com o objetivo de auxiliar empresas que estão começando ou já implementando iniciativas de qualidade a identificar e se preparar para o impacto que cada uma das “forças” descritas pode causar no caminho em busca da qualidade total.

Raquel Bartz Alves atua na área de qualidade e melhoria de processos como Analista de Qualidade. Trabalha na empresa Conectt S.A desde 2007 em projetos de melhoria de processos baseados no MPS.BR e PMBOK.