A existência de um elevado número de empresas familiares no Brasil é uma realidade, pois a economia nacional é em grande parte medida, alavancada e mantida por elas. Tal fato é motivo suficiente para que se estude o processo sucessório destas empresas, pois se em empresas privadas não-familiares a sucessão é um passo menos traumático, nem sempre acontece o mesmo nas familiares. É um processo delicado, cansativo, demanda tempo e, em alguns casos, altos investimentos, profissionalismo e um conjunto complexo de decisões a serem tomadas.

O cenário em empresas familiares geralmente apresenta o comando de uma única pessoa, que na maioria das vezes é o centralizador do poder, autoridade máxima, impregnando a empresa com seu pessoal. Há uma forte relação de confiança com os funcionários mais antigos, os quais são considerados parte da família.

É neste universo estreito e complicado, mas ainda dependente da sucessão, que este artigo desenvolverá o estudo sobre a problemática sucessória.

Nunca é cedo demais para iniciar o projeto de sucessão, pois os estudos demonstram que em muitos casos levaram-se anos para concluí-lo e em alguns casos não são bem sucedidos. Existem muitas temáticas a serem levadas em conta, como por exemplo: há algum membro da família que trabalhe na empresa e tenha o perfil executivo adequado para assumir a gestão do negócio? O fato de a empresa ser da família não basta por si só para validar a participação de uma pessoa no processo. A família entende a separação entre propriedade, empresa e família? Algum herdeiro tem interesse em levar adiante o legado familiar?

Para Bernhoeft (2009) não há nada que prejudique mais uma empresa familiar do que os seus conflitos familiares, ou seja, é a unidade familiar que garantirá a longevidade da empresa. O autor acrescenta ainda que “um fundador pode vender sua empresa ou comprar outras. Herdeiros que não se entendem sempre são comprados”.

Não há um consenso entre os autores sobre o percentual de empresas familiares no Brasil, entretanto fala-se que está acima de 90%. Para Martins (1991) e Bethlem (1989) este número fica em torno de 97%, já para Netz (1992) seria 99%. De qualquer maneira, confirma-se que empresas com esse perfil representam uma significativa fatia da economia nacional, portanto um mercado  interessante para estudos e prospecção de negócios, o que, aliás,  ainda é deficiente no Brasil.

A sucessão em empresas familiares é um assunto complexo, tem muitas diferenças, entre elas, o fato de ser na maioria das vezes um único executivo o centralizador do poder, de forma que seu perfil está impregnado na empresa; em alguns casos a administração está distribuída entre alguns membros da família ou das famílias, mas existe um acordo tácito de quem será o gestor, o mandatário. Outro ponto relevante é o comprometimento e o esforço que o fundador empenhou para criar a empresa e fazê-la crescer: estes não serão encontrados na segunda geração, que não raramente tem apenas interesses pessoais e a obrigação de ter que participar de uma empresa cujo ramo não lhe agrada.

Pelo que foi descrito e por muitos outros motivos, o processo sucessório é um assunto de importância vital para a sobrevivência da empresa, devendo ser pensado com muita antecedência, para que se possa colocar em prática todo o planejamento que deverá ser feito ao longo de anos, para garantir o êxito do projeto. Impõe-se levar em conta que o sucessor deverá ser aceito pela ou pelas famílias e pelos empregados e deve ser alguém com perfil carismático, humilde e acolhedor, que acima de tudo entenda que a sua presença representará uma nova e fundamental etapa na vida da empresa e dos funcionários.

É importante entender o perfil das empresas familiares e traçar um histórico que permita a compreensão de certos aspectos que serão relevantes no desenvolvimento do planejamento estratégico, obrigatoriamente feito por elas. Assim, de acordo com Gonçalves (2000), pode-se caracterizar uma empresa familiar das seguintes formas:

a)    a empresa é propriedade de uma família, detentora da totalidade ou da maioria das ações ou cotas, de forma a ter o seu controle econômico;
b)    a família tem a gestão da empresa, cabendo a ela a definição dos objetivos, das diretrizes e das grandes políticas;
c)    finalmente, a família é responsável pela administração do empreendimento, com a participação de um ou mais membros no nível executivo mais alto.

Adicionalmente, Lodi (1986) afirma que se pode definir este tipo de empresa como aquela que terá a sucessão ligada à hereditariedade, onde o sobrenome é um valor institucional. Gaj (2000) completa este conceito afirmando que o fundador tem a intenção de passar a um herdeiro direto ou parente por casamento, podendo ou não haver um membro familiar na administração.

Vale observar também que em muitos casos a sucessão será do próprio fundador da empresa, questão complicada e delicada, pois se sabe que na maioria das vezes os fundadores não se preparam para a aposentadoria, dificultando o processo. Entretanto é sabido que a sucessão acontecerá, podendo ser um passo gradativo, seguindo um programa de transição, onde cada um terá seu tempo para conhecer os planos e redesenhar a história, e em alguns casos pode ser de forma repentina, quando da morte inesperada do fundador. Em ambos os casos os problemas serão encontrados, pois no primeiro há que se trabalhar muito com o sucedido, e no segundo há que se trabalhar muito com o sucessor.

Na atualidade vive-se uma era de novas descobertas, de meios de comunicação muito rápidos, não havendo fronteiras para as negociações, pois a tecnologia derrubou as barreiras permitindo a conexão com todas as partes do mundo, o perfil dos executivos é muito diferente, o mercado está mais ágil, a concorrência mais acirrada, então é necessário que no processo sucessório saiba-se respeitar essas e todas as outras alterações que ocorreram ao longo dos anos, entendendo que o fundador oferecerá muita resistência ao ver sua empresa administrada com os novos métodos e ferramentas.

Estudiosos do assunto discorrem sobre as muitas dificuldades encontradas neste processo, Lodi (1989) se faz bem claro ao registrar as mais frequentes:

- Um empresário que não tem segurança quanto a capacidade de seu sucessor; um empresário que chegou muito tarde à presidência, substituindo um antecessor também concentrador; a falta de saída honrosa e viável, dedicando-se a outros empreendimentos pelos quais um dia esteve interessado.

Outros autores são unânimes em apresentar a transferência do poder como um dos maiores problemas, inclusive em virtude das gerações diferentes, posicionamentos divergentes, novidades estratégicas de um tempo mais exigente e dinâmico. Os pontos relatados fazem parte da gama problemática que envolve um processo de sucessão e devem ser levados em consideração na hora de desenvolver o referido projeto, pois sucessão não é assunto fácil e tampouco há um modelo único para acontecer.  

Referências


BERNHOEFT, R. Empresa familiar, crise vencida. 2009. Disponível em: < http://www.baguete.com.br/noticiasDetalhes.php?id=3507010> Acesso em: 9 jan. 2010.

BETHLEM, A . de S. Gerência à Brasileira. São Paulo, McGraw-Hill, 1989, 322 p.

GAJ, L. Tornando a administração estratégica possível. São Paulo: McGraw-Hill, 1990, 239p

GONÇALVES, J. S. R. C. As empresas familiares no Brasil. ERA Ligth, São Paulo, v. 7, n.1, p. 7-12, jan./mar. 2000.

LODI, J. B. A empresa familiar. São Paulo: Pioneira, 1986. 172 p

LODI, J. B.O fortalecimento da empresa familiar. São Paulo: Pioneira, 1989. 139p

MARTINS, M. L. Os difíceis caminhos da empresa familiar. Indústria e produtividade: Rio de Janeiro, n.145, p. 20-24, maio, 1981

NETZ, C. O patinho feio poder ser um belo cisne. Exame: São Paulo, v.24, n.6, p. 52-58, 18 de março 1992.

* Jorge Luiz Menegolla é acadêmico do oitavo semestre do curso de Administração de Empresas da Fargs.