A comparação é válida na atual realidade, pois em um setor que sofre com a falta de mão-de-obra e que já causa disputas acirradas entre as Empresas locais, o que poderemos esperar da chegada de Empresas que faturam U$ 2,24 bilhões ao ano, e que em questão de uma semana contratam 75 funcionários e colocam uma nova unidade em funcionamento? Este é o exemplo que ocorreu com a TCS, subsidiária da TATA indiana, na unidade que possuem em Campinas – SP. A TATA tem hoje 59.300 funcionários com presença em 34 países, e o faturamento anual acima comentado. Hoje em Campinas eles estão com 150 funcionários e até o final do ano a previsão é chegarem a 1.500. Qual Empresa nacional do setor de TI consegue um crescimento destes em tão pouco tempo? E de onde sairão estes funcionários? A resposta é óbvia... sairão da sua Empresa... inclusive bem treinados.
A mais de 2 anos escuto falar que o Brasil é geograficamente bem posicionado em relação a fuso horário com EUA, possuímos ótima mão de obra, criatividade, etc...etc... O que fizemos para aproveitar isso? Praticamente nada. Agora os indianos, alemães, e o resto do mundo estão invadindo o Brasil, e ainda por cima estamos brigando para atrair estas Empresas para o nosso Estado. Ou seja, dando um tiro no próprio pé, pois como o próprio pessoal da TCS afirma: “Não temos tempo de formar o profissional internamente, muitos são procurados no mercado”.- Info nº 239. Eu já diria que não são muitos, mas sim a maioria.
Quer dizer então que devemos fechar nossas portas as empresas multinacionais de TI? É claro que não. O que queremos mostrar é que se o setor de TI brasileiro não acordar, vai ser atropelado, e vai ocorrer algo semelhante ao que aconteceu na abertura da reserva de mercado anos atrás, onde Empresas como a Edisa foram aniquiladas.
Estamos sempre falando em exportação de software, mas não fizemos nem o tema de casa em relação à preparação de mão-de-obra, qualificação de nossas Empresas, fortalecimento do setor, etc. Enquanto se instalam no Brasil Empresas com CMMI 5, as nossas não conseguem nem organizar seus processos internos. Enquanto se instalam no Brasil empresas que pagam salários inflacionados com amplos pacotes de benefícios (o que acaba ficando barato, pois já pegam os profissionais treinados), nossas empresas passam grande parte do tempo preocupadas em estar constantemente formando esta mão-de-obra.
Nossas escolas técnicas e cursos de graduação em TI estão se esvaziando, não conseguimos nem completar as vagas dos vestibulares. Quando iremos acordar e ver que ações imediatas devem ser tomadas antes que não tenhamos mais mão-de-obra qualificada?
Além deste aspecto da mão-de-obra, temos outro fator que devemos levar em consideração: A concorrência destas Empresas, pois chegam brigando e tomando nossos clientes, sem termos tempo e condições de reagir. A culpa é exclusivamente nossa, que não estamos preocupados, até o momento, em nos qualificarmos para competir em condições de igualdade aqui, e na casa deles também... porque não?
Temos que deixar de lado a questão da projeção que a vinda de uma multinacional trás ao Estado. Esta projeção na verdade não está trazendo benefício nenhum, a não ser para a própria Empresa que se instala, pois ao contrário das nacionais, recebem grandes incentivos com a desculpa que estarão absorvendo grande número de vagas. Mas que vagas? O exemplo da SAP é claro. Dizem que contratarão 80 pessoas imediatamente e chegarão a 350 em 3 anos. Mas na verdade muito pouco destas vagas serão criadas, pois outras tantas serão fechadas em nossas Empresas. E mais uma vez, sabemos muito bem de onde sairão estes profissionais.
Da maneira que o setor de TI está se desenhando, nossas Empresas serão simples fornecedoras de mão-de-obra, terceirizadas das grandes multinacionais, não iremos produzir conhecimento, não iremos agregar valor as nossas Empresas, deixaremos de ser Empresas de TI para sermos agências de Emprego. Está na hora do Governo acordar e ver que enquanto o Brasil se preocupa em exportar toneladas de grãos, outros países lucram muito mais com a venda do conhecimento. Quanto vale 1Kg de processadores comparados e 1Kg de soja? E quanto rende para um país um profissional que agrega conhecimento diário ao seu trabalho, comparado a outros setores? Todos os setores da economia são importantes, não só os tradicionais em que nosso país está acostumado e acomodado a décadas a investir.
Porque o Governo não fomenta a parceria entre setor público, Universidade e iniciativa privada, quando se trata de Empresas locais? É claro que a vinda de gigantes como SAP, CA, TATA e outras, irá projetar nosso Estado. E isso atrairá cada vez mais Empresas deste porte, espremendo nosso mercado. Porque o governo não incentiva estas parcerias governo-Universidade-Empresas, focando em produtos que possam ser comercializados? Isso promoveria o desenvolvimento de Estudantes, Universidades e Empresas, gerando em contrapartida crescimento para o país. Quantos projetos financiados pelo Governo acabam engavetados no final, pois já cumpriram seu papel para os pesquisadores? Quantas grandes idéias estão perdidas e esquecidas dentro dos arquivos de nossas universidades? Para que foi investido este dinheiro se não foi retornado para a sociedade em forma de produto, emprego e divisas para o país. Temos que nos espelhar nos exemplos de outros países, e acordar antes que seja tarde. Somos hoje um dos países que menos registra patentes entre os grandes e emergentes.
Está na hora das nossas entidades realizarem um trabalho em conjunto para modificar este quadro. Temos que fazer um trabalho junto aos Governos municipal, estadual e federal, visando ações que incentivem as Empresas locais, e que estas possam se fortalecer e enfrentar as ameaças que estão surgindo. Temos que qualificar nossas Empresas incentivando iniciativas como o setorial de software, e criar outras mais que possam ajudar nossas Empresas. Se o governo não apoiar, financiar e incentivar nossas empresas a buscarem as certificações, vamos ter que buscar alternativas, o que não dá é para ficar parado ou discutindo sempre os mesmos assuntos sem chegarmos realmente a ação.
O Presidente da Assespro Nacional, Ricardo Kurtz, comparou certa vez nosso setor ao setor agrícola, para demonstrar como grande parte da culpa é do próprio Empresário do setor. Ele disse que enquanto os agricultores atravessam o país de trator e invadem Brasília para conseguir o que necessitam (e conseguem), nosso setor não se dá ao trabalho nem de pegar um avião e fazer número em uma votação que poderá fazer a diferença.
Nosso companheiro Vanderlan Vasconselos, coordenador do MCT/FINEP/RS, vive tentando incentivar a busca de recursos... a participação nos editais... acabamos perdendo para outros Estados e até mesmo sobra dinheiro que ninguém capta.
Nossas entidades representativas deveriam buscar o trabalho em conjunto, visando o crescimento do setor no Rio Grande do Sul, independente de quem dê a partida, colocando em primeiro lugar o interesse coletivo. Afinal nossas entidades estão entrelaçadas, pois as Empresas geralmente já participam sempre de pelo menos duas.
Na verdade, todos tem que fazer o tema de casa. O Governo incentivando o setor seja com subsídios para treinamento e qualificação, seja na área tributária; os empresários tem que se preocupar em formar mão-de-obra qualificada, qualificar também seus processos e métodos, e realmente brigar para que suas necessidades sejam atendidas pelo governo; e as Universidades devem procurar a aproximação como a iniciativa privada, focando em pesquisas que possam se tornar em produtos comercializáveis que gerem divisas e empregos.
Se todos fizerem a sua parte... que venham os indianos... que venham os alemães... que venham todos... estaremos preparados.
Cláudio Schneider é diretor da Personasystem e diretor de RH da Assespro-RS
A comparação é válida na atual realidade, pois em um setor que sofre com a falta de mão-de-obra e que já causa disputas acirradas entre as Empresas locais, o que poderemos esperar da chegada de Empresas que faturam U$ 2,24 bilhões ao ano, e que em questão de uma semana contratam 75 funcionários e colocam uma nova unidade em funcionamento?