Não saia copiando ideias que não fazem o mínimo sentido…
No curso passado, em São Paulo, eu conversava com os alunos sobre a importância do grupo de atendimento realizar reuniões periódicas de feedback. E um dos colegas – Paulo Renato – me questionou sobre a técnica sanduíche, pois já ouvira falar dela.
De maneira simplificada, ela sugere que ao intencionar dar um corretivo a um funcionário sobre determinado comportamento, assegure-se de bolar um positivo antes e depois do mesmo:
Eu passei um ano e meio estudando grupos e seus desenvolvimentos na SBDG(Sociedade Brasileira de Dinâmica de Grupos). Li junto com meus colegas vasta literatura, analisamos as variadas teorias de grupo e… Nunca nos deparamos com qualquer trabalho científico a respeito.
Ainda assim, você sabe – lá no fundo – que não faz o menor sentido um gestor se comportar dessa maneira.
Você é um dos melhores funcionários que nós temos – quando está aqui; mas se não melhorar sua pontualidade nos próximos dois meses, nós precisaremos mandá-lo embora. Você tem mais talento do que a maioria dos seus colegas e é por isso que me preocupo com você.
É um método razoavelmente bem intencionado dos gestores tentarem uma maneira “humana” de comunicar ao funcionário o quão ruim ele está fazendo algo, mas que, no final das contas, acaba sabotando o próprio objetivo do feedback e a relação do supervisor com o colaborador.
E o gestor sente-se mais leve por que afagou o ego do colaborador, apresentando as suas coisas boas enquanto aponta aquela que precisa ser corrigida. Mas isso atende somente o lado do gestor: sentir-se aliviado.
Antes de continuar, é bom esclarecer que feedback é uma expressão “roubada” da eletricidade. Por isso, quando falamos feedback positivo ou negativo, trata-se de coisas como corrente elétrica ou de tensão.
Ou seja, um feedback negativo não é algo “mau” como a conotação em português acaba transformando o adjetivo citado (lembre-se lá das aulas do colégio, onde aprendeu que o elétron possui uma carga negativa e isso não diz nem que é bom, tampouco ruim).
É assim: algo está com corrente +10, enviamos um feedback -5, e o resultado é uma corrente igual a +5.
A ideia do feedback é controlar, aumentar ou diminuir o comportamento de um grupo ou de um indivíduo, dado o “empréstimo” dessa expressão de um dos ramos da física. Só que nesse contexto de feedback humano, ela se distorce e carrega um quê de condenável, de ruim, de grosseiro.
“- O feedback negativo deve ser feito em caráter privado e o feedback positivo, sempre que possível, de forma pública.”
Ughs, que burrada. Peguei você, hein? É como tem feito até hoje?
Caramba, se o sujeito roubou um computador da sua empresa, não há feedback a fazer. É demissão (perdão pela ênfase e fervor, mas como confiar numa pessoa depois disso?) na certa.
É como dizem aqui nos pampas: “- Cachorro que comeu ovelha uma vez, só matando se endireita.”
Mas se não é um fato crítico desses, estamos discutindo comportamentos que podem ser melhorados e habitualmente é sempre o chefe (ou com o atual eufemismo “líder”) a dar esses retornos; ele (o chefe) acaba estigmatizado. Quando diz para alguém “- Vamos tomar um cafezinho“, “- Vamos até a copa” ou coisas parecidas, o povo já sabe do que se trata.
Agora, quando isso é feito em reunião com o grupo, existe uma oportunidade do chefe se livrar dessa “pecha” de malvado. O grupo se retroalimenta com feedbacks.
O gestor vê-se aliviado daquela imagem de carrasco, crápula, etc. por que sempre foi o responsável por repreender alguém (não que também não o seja).
Mais: os outros participam, podem dar suas diferentes visões sobre uma mesma realidade. E podem, o que é ainda melhor, aprender. Sim, aprender com os comportamentos que foram bons e os que não foram dos outros membros do time.
Se quiser pesquisar sobre essa ideia de equipes autogerenciáveis, procure na internet pelo modelo Toyota de gestão (lá de 1950).
O estilo do chefe levar para uma sala, em privado, e passar um xixi ou administrar a técnica sanduíche (mais amena e humana, mas apenas no calidoscópio do chefe), ainda é uma herança do século passado, de um estilo de administração militar já obsoleto, de um método de gestão hierárquico e que, como sempre digo aos meus alunos, eles aprenderam ao lerem livros da Geração X sem pensar ou criticar.
Vamos combinar que depois da segunda vez recebendo feedbacks assim, o colaborador não é mais ingênuo. Ele sabe que virá um carinho, uma paulada e um chamego novamente.
E no primeiro feedback positivo já vai perguntar: “- O que foi que eu fiz de errado agora?“. Hahaha, é vero.
As pessoas que confiam nesse método sanduíche desdenham o funcionário ao imaginar que ele sairá feliz. Não sairá assim. Aliás, pode até confundi-lo sobre os reais motivos do chefe.
Também os “líderes” acham que podem destruir uma pessoa ao falar de maneira direta um feedback negativo para ela. Se estiverem lidando com adultos, é melhor que não os tratem como crianças de 10 anos. Que elas mastiguem o que receberam em silêncio, voltem pra casa e pensem e pensem sobre o assunto.
Todos os ensinamentos em relação a desenvolvimento de grupos envolvem uma atuação espontânea de todos os participantes. Você lê Bion, Lewin, Pichon Rivière,Moreno e vários outros autores contemporâneos e todos eles escrevem: abandonar as relações estereotipadas para que as coisas melhorem. Ser autêntico.
E convenhamos, construir dois artifícios (um positivo antes e outro depois) para somente falar o que pretende não é nada autêntico. É como colocar uma máscara de bonzinho, depois falar sério e depois pegar a máscara novamente.
E se você tiver paciência, leia o último artigo que aponto no rodapé. Ele aponta os motivos pelos quais os gestores usam esse método. Resumindo:
Well done.
Abs
EL CO
PS. Mas se depois de todos esses argumentos você ainda leva fé no método, leia esses três artigos em inglês:
Abraços
EL CO
PS: OK, podem descarregar seus feedbacks na área de comentários, hahaha.