Mas o que ele procurava nem era mais o amor, mas ao menos, uma surpresa. Porque se tocava o telefone, ele já sabia quem era e quantas vezes tinha falado com aquela pessoa e quanto tempo tinha durado cada ligação. E se o número era desconhecido, ele não atendia mais, porque número desconhecido representava encrenca ou incomodação, telemarketing, assinatura de revista, gerente de banco ou coisas assim.
Porque o que ele procurava era uma saudade genuína. Ele desejava ardentemente não saber dos seus amigos. Mas ele sabia. Ele sabia tudo que estava acontecendo com o Carlinhos em sua temporada na Escócia. Sabia mais do Carlinhos agora do que quando moravam juntos. Sabia que semana passada, o Carlinhos cortou o cabelo e que conheceu duas brasileiras e que foi a um show de blues escocês e que bebeu um uísque raro, envelhecido mais de 50 anos ou algo assim.
Porque o que ele queria era uma descoberta, uma descoberta simples e trivial, como um bistrot escondido ou uma vendedora de flores, mas quando ele pensava estar próximo da descoberta, seu celular avisava quem era o dono daquele bistrot e há quanto tempo ele tinha aberto e a avaliação de outras pessoas que estiveram ali e que outros lugares eles frequentaram, inclusive que flores haviam comprado da vendedora, que ficava em uma banca em frente ao bistrot. E ele perdia o entusiasmo da descoberta.
Porque o que ele queria era apenas ter uma novidade para contar, mas quando ele começava a contar suas novidades, as pessoas já sabiam e já queriam novidades mais recentes, porque a sua estava ultrapassada, o que ainda era novidade para ele já não era mais para os outros.
Foi por isso que ele se apaixonou pela por Maria Clara. Porque Maria Clara sempre tinha uma surpresa. Às vezes, Maria Clara ligava do orelhão ou até mesmo para o número do bar em que ele estava e isso o encantava. Porque Maria Clara não tinha avaliações sobre o último filme, o último bistrot ou sobre a vendedora de flores. Porque quando Maria Clara aparecia, ele ficava feliz por poder matar as saudades de Maria Clara. Porque Maria Clara sempre tinha uma novidade. E essa novidade era o amor.