Renato Galisteu.
A propriedade mais importante do vidro é a transparência. Isso na física. Esteticamente, o vidro tem diversas outras “propriedades” (como a sensação de grandeza, liberdade etc), mas, no fundo, causam a mesma sensação de transparência. Se você não entendeu a indireta, talvez já saiba qual é o problema da sua empresa e o motivo de você ter uma rádio peão com excelente frequência de funcionamento.
Talvez você nunca tenha reparado, mas a principal forma de aproximação entre pessoas é falando mal de algo ou alguém. Raramente as pessoas se aproximam para discutir o contrário. Não é um crime, é comum, todos fazem. A insatisfação com algo sempre vai gerar muita discussão, vários pontos de vista de diversas coisas e, acima de tudo, muita conversa sobre essas coisas. É orgânico, parte do ser humano e sua forma de se relacionar.
Culturalmente, quando as pessoas se juntam para falar bem de algo ou alguém, elas são “puxa-sacos”. Se elas se juntam para falar mal de alguém ou algo, elas só estão fofocando. E quando você reprova essa atitude, normalmente você fala mal das pessoas que agem assim (e você está errado, por estar falando mal de algo que já estava errado). De alguma forma bem louca, esta é a lógica.
As pessoas falam, indiscriminadamente, o tempo todo. Então, para o bem da sua empresa, não ajude que essa cultura torta se propague. Lembre-se do vidro e seja transparente. As pessoas só se engajaram com a sua empresa se souberem que fazem parte de algo maior (que a companhia tem um objetivo claro) e se entenderem que suas funções têm importância dentro desse contexto (e que poderão crescer fazendo suas atividades).
Antes que você pense em comentar sobre, claro que sei que é muito difícil proporcionar crescimento hierárquico para todas as pessoas da empresa. Mas não é apenas sobre isso. E se você somente pensou nesta hipótese, é melhor reavaliar sua posição como líder. Adicionar conhecimento, com cursos, capacitações viagens etc, também é crescer. E talvez, após um curso ou dois, o funcionário desenvolva aptidões para uma outra posição, num setor diferente.
Voltando ao ponto principal, se os objetivos da sua empresa forem transparentes, com metas tangíveis e bem disseminadas por entre seus funcionários, com anseios e dores compartilhadas, o envolvimento da companhia será maior (assim como também será mais fácil identificar quem não quer participar da sua visão de futuro). A rádio peão só existe, pois a sua empresa deixou existir. E a força dela significa a fraqueza da sua comunicação (sim, sempre ela). Ou se comunica corretamente, ou as mensagens sempre terão gargalos, falhas e ruídos.
Depositar ao departamento de recursos humanos a missão de corrigir essa falta de comunicação adequada é um tremendo tiro no pé. Não é uma missão apenas do RH ou só do departamento de comunicação. É uma missão da empresa como instituição. Com o passar do tempo, as boas empresas para trabalhar serão aquelas que contam com clareza no discurso e regularidade no trato com o funcionário. Não é um objetivo utópico, só requer o investimento dos “bens” mais valiosos que existem: tempo e informação.
Os principais patrocinadores de um projeto para extinguir a rádio peão são os sócios, donos, diretores ou gestores, pois são os responsáveis por transmitir a mensagem corretamente ou por falar de forma aberta e clara com todo os funcionários. Entenda que quanto menos codificada e mais aberta for a mensagem, melhor para toda a estrutura de trabalho.
Senhor presidente (ou CEO, para os que preferirem): seja o encarregado pela transparência e pela comunicação clara. Queridos gestores e diretores: não tenham medo de passarem a mensagem como ela é. Essa falsa sensação de controle da informação vai apenas prejudicar a sua área (e quando uma engrenagem não funciona, todo o motor sente o tranco).
Minha dica é a mesma que tenho dado desde o primeiro texto que escrevi aqui: tenha um profissional de comunicação dentro da empresa, que possa se movimentar por todas as áreas e departamentos, coletando informações para poder retransmiti-las corretamente no cotidiano. Uma empresa é como um corpo humano e a comunicação (não o departamento, mas a comunicação em si) é o oxigênio, o sangue.
Vale ressaltar que obviamente você nunca terá a satisfação completa das pessoas – e nem deve querer isso. A insatisfação é necessária para proporcionar mudanças. Ela não deve ser desestimulada, mas não pode ser generalizada. Se canalizada, a insatisfação pode resolver problemas ou melhorar processos. É tema para muitos outros artigos, mas pense nisso com carinho.
Se você estiver sofrendo disso, comece reunindo sua empresa em torno de uma campanha interna ou pesquisa de clima organizacional, e tome atitudes com as informações captadas, pelo bem da empresa. Esse começo, embora básico, requer muita maturidade no trato com a informação captada, pois, basicamente, você pode ser atingido de muitas formas. Trabalhe os pontos principais e mais generalistas e deixe que os gestores de unidades cuidem do que é pontual.
*Renato Galisteu é especialista em comunicação e mídia social, jornalista de tecnologia e pai do Noah. Este artigo foi originalmente publicado no LinkedIn.