
Steve Brazier.
O futuro da TI está na nuvem. Players como Salesforce.com e Amazon têm ofertas sólidas para o meio corporativo. O modelo de negócios dos canais de vendas será profundamente transformado nos próximos anos... ou não.
Pelo menos é o que aponta Steve Brazier, um ex-diretor do Gartner que há 15 anos montou sua própria consultoria, a Canalys, focada em revendas de TI, e parece ter um prazer especial em cutucar os hypes promovidos em parceria por empresas de análise e a mídia, esses fanáticos por novidades.
Brazier comanda uma consultoria pequena [receita de US$ 9,6 milhões no ano passado, contra US$ 1,7 bilhão da sua antiga empregadora] mas isso não precisa ser encarado como um ponto fraco, numa indústria que vende basicamente opiniões e insights e precisa ter liberdade para fazer isso.
O executivo britânico não tem papas na língua. Citando as perdas financeiras no último ano da Amazon Web Services e Salesforce, Brazier diz que é “irresponsável”, por enquanto, entrar em uma corporação e sugerir para a gestão colocar sistemas críticos nas nuvens desses fornecedores.
“Muitos membros da mídia e de empresas de análise parecem bancar os ingênuos quanto a isso. Você não sabe se aquele serviço continuará operando no próximo ano ou se o preço dele será o dobro ou triplo do atual para manter o modelo econômico viável”, fulmina o analista.
Quem quiser conhecer mais dos pontos de vista de Brazier e do trabalho da Canalys terá uma oportunidade em breve. A empresa planeja entrar no mercado brasileiro em alto estilo neste ano, por meio de um evento que pretende reunir 600 executivos, em outubro, no Rio de Janeiro.
O modelo de negócios de quem vende tecnologia mudou muito desde que fundou sua consultoria, há 15 anos?
Diria que é idêntico ao que víamos lá atrás. O que um canal de TI faz é prover soluções que atendam demandas tecnológicas das organizações. Ao longo desse tempo, as necessidades das empresas mudaram, mas seus parceiros continuaram a exercer a função básica de ajudar na adoção de tecnologia. Estou muito seguro de que o cenário continuará muito parecido pelos próximos 15 anos. Veja, as mudanças ocorrem no campo da tecnologia, não na forma como o canal trabalha. Talvez, a exceção seja pelo fato de que o ambiente tecnológico fica cada vez mais complexo, o que, no final das contas, representa uma oportunidade adicional para que integradores e revendas ganhem mais dinheiro. O ponto é simples: entram novos produtos como Apple, Android, e outras marcas, na discussão com os clientes. O que eles devem escolher de acordo com suas necessidades? Melhor manter o Windows 8, adotar um Chromebook ou partir para tablets?
Em que áreas da tecnologia um provedor deveria prestar atenção?
É preciso ver o que o cliente quer, reconhecendo que as necessidades dessas empresas estão em constante mudança. Se ele requer uma solução de mobilidade, o parceiro tem que ser capaz de ajudar nesse processo, seja vendendo ou não o dispositivo, mas certamente provendo questões fundamentais como integração e segurança que permitam a melhor utilização daqueles recursos.
O interlocutor que decide a compra de tecnologia dentro das empresas não se restringe mais à figura do CIO. Isso traz uma nova dinâmica de vendas, ou não?
Isso, realmente, está acontecendo. É uma boa questão. Fica cada vez mais difícil dizer o que é a indústria de TI, o que é apenas indústria. Tesla [fabricante de carros elétricos] é uma empresa automotiva ou de tecnologia? Com o dinheiro para tecnologia movendo-se para outro patamar, há muita discussão em diversas frentes sobre o que é o budget de TI. Por exemplo: campanhas de marketing mirando redes sociais, é tecnologia ou mídia?
As fronteiras entre as indústrias não estão mais tão bem demarcadas.
Ficou extremamente difícil definir isso. Muitos dos canais de TI focam suas atividades na oferta de infraestrutura corporativa, software ou serviços. Se uma empresa fizer algum tipo de campanha de mídia focada em redes sociais [que certamente irá requerer sistemas e ferramentas tecnológicas], essa demanda certamente não será atendida por uma revenda tradicional. Mas o mercado “mais tradicional” continua bastante sólido. Apesar de não crescer 10 ou 20% ao ano, segue em ritmo anual de crescimento.
Indo um pouco mais a fundo em uma resposta anterior, você mencionou um sistema operacional [Google Android] e um dispositivo [tablet] que não estavam no radar nem de CIOs nem de revendas há alguns anos. Isso não muda aspectos como, por exemplo, composição de portfólio ou estabelecimento de parcerias em um cenário de novos provedores?
As coisas seguem sua evolução. Se uma empresa continuar focada na venda de sistema operacional Novell ou PCs da marca Compaq, possívelmente já não está mais fazendo negócio! Portanto, é preciso continuar a se mover para onde o futuro aponta. É uma evolução natural. Eu discuto um pouco com você porque a mídia, bem como analisas de algumas firmas de consultoria, adoram hypes, adoram reforçar “a próxima grande novidade”. Quase todos esses hypes e esses exageros são coisas imaturas quando se fala com canais e, especialmente, com clientes. A nuvem, por exemplo, tem um tratamento totalmente superdimensionado.
Sim?
Certamente. Ainda é não se encontra hoje em dia alguma empresa que seja puramente de nuvem, de software ou infraestrutura, lucrativa.
E quanto a Amazon Web Services ou salesforce.com?
Como eu disse, meus amigos da mídia e de algumas empresas de análise, gostam de promover esse hype. Eles normalmente não fazem uma checagem profunda nesse tipo de companhia. Nos últimos trimestres, a medida que as vendas da salesforce.com cresciam, suas perdas aumentavam. Os dados financeiros da Amazon não são públicos, mas nossas análises sugerem que a AWS perdeu algo como US$ 1 bilhão ao longo dos últimos quatro trimestres. Mas esse é o problema, muitos membros da mídia e de empresas de análise parecem bancar os ingênuos quanto a isso, não olhando os fatos e acreditando no hype. É irresponsável, em um país como o Brasil, entrar em uma corporação séria e dizer “por favor, confie seus ativos core em uma empresa que perde tanto dinheiro” porque você não sabe se aquele serviço continuará operando no próximo ano ou se o preço dele será o dobro ou triplo do atual para manter o modelo econômico viável.
Se fosse para dar um conselho ao dono de uma revenda, para que prestasse atenção em algumas tecnologias para o futuro. Quais seriam?
Vou tentar não dar uma resposta superficial. Claro que qualquer um diria frente a uma pergunta como essas seria: mobilidade, cloud, social e big data. Mas, nosso trabalho é ser realista e ir além do hype, o que não significa que essas tendências que mencionei não estão acontecendo; mas o ritmo, especialmente em nuvem e análise de grandes volumes de dado, é menor do que a imprensa gosta de noticiar, especialmente devido ao modelo de negócios e questões de segurança de dados, além de aspectos como infraestrutura de tráfego em países como o Brasil. É preciso ficar atento a essas macrotendências. Mobilidade é algo que já vem acontecendo. Agora, impressão 3D é algo que tende a virar realidade daqui a cinco ou dez anos, logo, não é para os próximos 12 meses. Mas, se eu tivesse a frente de um canal, hoje, conversaria com um fabricante desse tipo de tecnologia para ser um dos primeiros do mercado local a fornecer esse tipo de solução. Quanto antes você começa, melhor será sua posição quando o conceito estiver maduro. Certamente não será algo que irá trazer resultados no ano que vem, mas uma frente rentável para o futuro. Além disso, buscaria oportunidades no desenvolvimento de aplicativos, indo ao cliente e perguntando “como posso desenvolver apps para sua empresa ou para seus clientes de forma a mudar revolucionar o modelo de relacionamento?”. O terceiro ponto seria segurança. Esses seriam meus focos prioritários, o que não significa que seja possível ignorar as outras coisas.