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A coexistência entre sistemas on-premise e cloud é possível?

Sistemas de missão crítica, como ERPs, têm propósitos completamente diferentes de sistemas estratégicos ou aplicações de inovação.

10 de outubro de 2024 - 11:38
Luiz Mariotto (Foto: Divulgação)

Luiz Mariotto (Foto: Divulgação)

Contar com um ERP robusto e confiável é crucial para que médias e grandes empresas de todos os setores tenham uma visão unificada e segura dos dados para a gestão e para o dia a dia operacional da companhia - especialmente no que se refere à realização de tarefas de missão crítica. No cenário atual dos negócios, de evolução tecnológica e crescente demanda por flexibilidade e eficiência, o debate acerca da coexistência entre sistemas on-premise e cloud vem cada vez mais ganhando relevância entre os C-level e boards administrativos. Afinal, entender a fundo essas abordagens é essencial para o ganho de eficiência operacional, e para que a inovação entregue verdadeiro valor ao negócio na busca por melhores margens. 

A verdade é que nem todas as empresas funcionam da mesma forma. As necessidades de uma companhia podem não ser as necessidades de centenas ou milhares de outras. E é muito importante levar isso em conta ao pensar na integração entre sistemas e aplicações ou na migração para uma nova solução na nuvem, especialmente se estivermos falando de um software corporativo da complexidade de um ERP. Por muito tempo, os sistemas on-prem foram a solução padrão adotada pelas empresas, porém à medida que questões relacionadas à segurança na nuvem foram evoluindo, muitas passaram a adotar a IaaS (Infrastructure as a Service), levando seus sistemas legados para nuvens como Azure, Microsoft, Google Cloud e AWS.

É preciso considerar que sistemas de missão crítica, como ERPs, têm propósitos completamente diferentes de sistemas estratégicos ou aplicações de inovação voltadas a user experience, por exemplo. Dessa forma, objetivos diferentes pedem modelos de uso diferentes, e isso é essencial para que a empresa tenha business cases claros em relação a sistemas que precisam ser em nuvem, e os que devem permanecer no modelo de licenças.

A mudança de estratégia da SAP

O mercado se surpreendeu quando a SAP anunciou, em 2023, que as novidades e novos recursos da empresa só seriam entregues na nuvem pública e na nuvem privada com a utilização do RISE como habilitador. E essa decisão estratégica, segundo a fabricante, envolve a inovação com IAs e sustentabilidade na qual a empresa está investindo.

Na prática, a empresa estabeleceu algo que muitos clientes temiam há muito tempo: a SAP está mais do que disposta a deixar empresas para trás caso elas não convertam suas licenças de software para assinaturas baseadas em nuvem. A decisão da SAP leva em conta, obviamente, a busca por maior lucratividade dela própria. 

É nesse cenário que a SAP vem acentuando sua estratégia de migração para a nuvem, o que pode complicar o futuro para clientes que ainda utilizam soluções on-premise. No entanto, apesar dos empecilhos, muitas empresas preferem manter seus sistemas estáveis e inovar de forma independente, optando por alternativas como o suporte independente, que permite que as companhias mantenham seus legados, maximizando o investimento já feito.

De um lado, ninguém quer uma tecnologia que não seja a melhor possível para a sua companhia, afinal, é necessário adaptar-se o tempo todo a um ambiente de negócios dinâmico e competitivo. De outro, as empresas não querem abrir mão dos sistemas já customizados e de todo investimento feito ao longo de muitos anos. 

De acordo com dados da Basis Technologies, apenas 57% das empresas que usam as soluções on-premise da SAP estão a caminho de migrar para o sistema em nuvem S/4HANA antes do término do suporte de manutenção regular em 2027. E, apesar desse deadline, no começo de 2024, cerca de 70% da base de clientes da SAP ainda não havia iniciado sua migração para o sistema em cloud.

Um Relatório de Investimentos da DSAG 2024 mostrou alguns dados interessantes sobre o cenário. Os membros da DSAG, organização formada por clientes da SAP da Europa, foram entrevistados e 61% não pretendem fazer a migração para o serviço na nuvem. Além disso, os entrevistados se mostram críticos à estratégia de migração da SAP e querem garantir que as empresas on-prem continuem a ter acesso às inovações estratégicas da fabricante. Em resumo, os clientes SAP por enquanto ainda não vêem business cases claros para fazer essa migração. 

Como abrir mão das customizações e de altos investimentos já feitos?

A adoção de um novo ERP na nuvem não acontece de um dia para o outro. Não é incomum que a migração dure dois ou três anos, sendo feita de forma gradual e estratégica, e muitas vezes até tornando-se um modelo híbrido em que on-prem e cloud coexistem simultaneamente dentro da mesma organização. No modelo IaaS (Infrastructure as a service) ou PaaS (Plataform as a service), é possível combinar os benefícios de uma infraestrutura ou mesmo aplicações em nuvem, com outros sistemas ainda on-premise e super customizados.

E, é importante destacar: a migração de um sistema on-premise para cloud pode resultar na perda de algumas customizações em uso, especialmente se forem altamente específicas e profundamente integradas ao código base do sistema. Isso pode acontecer devido à abordagem Clean Core da SAP, que visa manter o núcleo do sistema o mais limpo e standard possível: ou seja, com o mínimo de customizações e alterações no código e utilizando as funcionalidades e configurações oferecidas pela própria plataforma.

Deve-se, portanto, fazer uma análise detalhada antes da migração para avaliar quais customizações fazem parte de um legado valioso e consistente, e como elas podem ser implementadas no novo ambiente, gerenciando assim o risco de perda de dados e interrupção de serviço.

Os benefícios de uma estratégia híbrida e innovation around the edges

Não há dúvida de que a nuvem é uma realidade de mercado que veio para ficar. Mas quando o assunto é a migração para este modelo, há que se tomar cuidado com a pressão dos fabricantes de TI e os prazos dados por eles para o encerramento do suporte às versões antigas de seus softwares. Há alternativas e, neste caso, cabe a cada organização conhecer e compreender as opções de mercado que se adequem de forma mais estratégica aos seus objetivos e roadmap de negócios.

A chamada inovação nas bordas, ou o Composable ERP, se refere justamente em focar o budget de TI em tecnologias de fácil implementação e com potencial de trazer ROI relevante e significativo. Dessa forma, os C-Levels podem alcançar soluções tecnológicas para suprir suas necessidade de inovação enquanto garantem benefícios reais e sustentáveis para suas empresas. 

Se o ERP on-prem está implantado e é suficientemente bom para atender à demanda da sua organização atualmente, ótimo. A sua organização tem o orçamento necessário e quer fazer a migração para a nuvem? Ótimo também. O importante é que todos os players tenham a compreensão de que as empresas podem ter outras prioridades que não adotar a nova versão de sistemas já operacionais e eficientes. O foco deve ser pensar estrategicamente nas necessidades da sua organização, com sistemas on-premise, cloud ou mesmo no modelo híbrido. A escolha, no fim das contas, deve seguir o planejamento de cada companhia, e o melhor: no seu próprio tempo.

*Por Luiz Mariotto, vice-presidente global de produtos SAP da Rimini Street