Marcha dos Prefeitos é um evento da CNM. Foto: Valter Campanato/ Agência Brasil
A Confederação Nacional dos Municípios demitiu no final do ano passado a equipe interna responsável pelo desenvolvimento do Urbem, software de gestão para prefeituras, colocando o futuro da solução em mãos de empresas privadas.
Segundo a reportagem do Baguete pode apurar, o suporte das prefeituras que já usam o produto ficou com a Papelweb, de São Paulo. O código está disponível em open source desde o final de 2014 no Portal do Software Público.
A reportagem do Baguete procurou a CNM em diversas ocasiões para questionar os motivos que levaram à decisão e os critérios de transferência do suporte.
Por meio da sua assessoria de imprensa, a entidade desconversou, inicialmente alegando que o responsável pela decisão “estava de férias” para depois parar de retornar os contatos.
O Urbem é um descendente do Siamweb, software desenvolvido para a CMN pela Ccanet, uma pequena empresa gaúcha com sedes em Bagé e Viamão que vendeu as fontes do produto para a associação nacional de prefeituras.
Segundo fontes ouvidas pelo Baguete, a entidade investiu R$ 750 mil na aquisição do software, há quase uma década.
Depois, a entidade teria contratado 20 analistas para desenvolver o produto, bancando o desenvolvimento desde então a um custo estimado de R$ 20 milhões.
Tudo indica, no entanto, que o software nunca decolou como um player significativo no mercado de ERP para prefeituras, apesar do poderio e visibilidade da organização, promotora de eventos conhecidos e com influência política como a Marcha dos Prefeitos.
A CMN não revela qual é a base instalada do produto. Em uma comunicação com o Ministério do Planejamento sobre a transferência do software para o Portal do Software Público, o então presidente da CNM, Paulo Ziulkoski, citou sete cidades, a maioria delas localidades pequenas no Norte e Nordeste.
A maior delas é a baiana Alagoinhas, uma cidade de 153 mil habitantes a pouco mais de 100 km de Salvador. No mais, a lista inclui locais como a paraibana Caaporã (20 mil habitantes), a potiguar Itaú (5,8 mil) e a amazonense Manaquiri (27 mil).
A única cidade fora do Norte e Nordeste da lista é a gaúcha Mariana Pimentel, lar de 3,7 mil pessoas e, talvez não por acaso, uma cidade na qual Ziulkoski já foi prefeito entre 1993 a 1996 e 2001 a 2004.
A decisão da entidade de parar de investir diretamente no Urbem pode ter que ver com uma percepção sobre os rumos da política pública em relação a software open source para prefeituras no país.
Ao longo das administrações petistas, diferentes responsáveis pela política pública de tecnologia repetiram o argumento de que o software de gestão proprietário oferecido por empresas privadas era muito caro para a maioria das prefeituras.
A resposta estaria em programas como o Cidades Digitais, uma iniciativa de digitalização de prefeituras do Ministério de Comunicação que inclui a implementação do e-Cidades, outro software open source para prefeituras disponível no Portal do Software Público.
O Cidades Digitais selecionou 80 cidades em 2012 e agregou outras 262 em 2013, quando o programa entrou no guarda-chuva do PAC. Os critérios de seleção foram ter menos de 50 mil habitantes, baixo IDH e pequena penetração de acesso à Internet.
Caso tenha sido executado na íntegra (o que é pouco provável), o programa teria transformado o e-Cidades, na solução de gestão para prefeituras com maior base de clientes do Brasil, ainda que com prefeituras menores.
O vento mudou de rumo em Brasília, no entanto. A nova administração de Michel Temer tem mostrado sinais de reversão de rumos, abrindo grandes licitações de software Microsoft e contratando provedores de nuvem privados.
Nesse contexto, a desativação do Portal do Software Público parece uma questão de tempo.