
Tecnologia ou varejo? Foto: Depositphotos.
A Federação dos Trabalhadores em Processamento de Dados, Serviços de Informática e Tecnologia da Informação (FEITTINF) encaminhou uma denúncia ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) contra a empresa Kyndryl por falso enquadramento sindical.
De acordo com a FEITTINF, cujo principal integrante é o poderoso sindicato paulista Sindpd, a Kyndryl optou por um cadastro na categoria errada do Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) visando escapar do sindicato.
A FEITTINF, ou o Sindpd, tem lá o seu ponto. O CNAE da Kyndryl, que abriu operações no país em 2021, é o de atividade de comércio varejista.
Parece difícil de encontrar uma linha de argumentação que case essa descrição com a atividade efetiva da Kyndryl, que é um spin off da antiga área de serviços de infraestrutura da IBM com cerca de 5 mil funcionários no país.
A Kyndryl não parece muito interessada em debater o tema, pelo menos publicamente.
Procurada pela reportagem do Baguete, a empresa disse apenas que está seguindo “os processos legais cabíveis” e “discutindo com as autoridades relacionadas”, duas coisas que ela não tem como não fazer.
A questão do CNAE não é só uma informação em um formulário. O enquadramento define que sindicato representará os funcionários da empresa (no caso, o dos comerciários), além das normas da convenção coletiva sobre a qual eles devem trabalhar, incluindo a jornada de trabalho, por exemplo.
“A empresa age de forma a alterar a realidade dos fatos, buscando o enquadramento sindical da empresa baseado na indicação de CNAES que não representam a atividade principal e específica exercida pelos seus empregados. Assim, inquestionável a tentativa de modificar a realidade dos fatos para buscar proveito econômico próprio, em detrimento dos interesses da classe trabalhadora e das demais concorrentes do mercado, que seguem a legislação”, diz trecho da denúncia.
A FEITTINF fala em “dumping social”, classificando a manobra da Kyndryl como uma forma de “descumprimento da legislação trabalhista” e “concorrência desleal”, citando empresas como Accenture, DXC e a brasileira Tivit, todas do setor de tecnologia (gosta de criar uma intriga a FEITTINF).
“Por óbvio, na concorrência deste voraz mercado, a denunciada possui privilégios por não cumprir as normas da categoria dos trabalhadores da categoria específica, lastreando-se em norma coletiva distinta, notadamente menos benéfica aos trabalhadores da categoria específica”, aponta nota da federação.
A FEITTINF termina citando a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e normas da CLT no sentido de que o enquadramento sindical deve optar sempre pelo sindicato mais específico.
Assunto fechado então? Não é tão fácil assim. A denúncia da FEITTINF contra a Kyndryl é a continuação de uma briga do Sindpd contra a IBM, sua antecessora.
Já em 2008 (a memória do Baguete é longa) o Sindpd brigava para mudar o enquadramento sindical da IBM, que também se define como uma varejista.
O tema seguia vivo em 2013, quando cerca de mil trabalhadores da IBM em São Paulo e Hortolândia colocaram seus nomes em um abaixo-assinado virtual pedindo a mudança do enquadramento sindical da empresa.
Por outro lado, a IBM se defendia apontando seu histórico e origem como fabricante de computadores, duas coisas que a Kyndryl não tem.
A questão do enquadramento é mais ampla que a IBM e os seus spin offs. A Dell, por exemplo, lida com o sindicato dos metalúrgicos em Campinas, onde tem uma fábrica (está bem que existem servidores "bare metal", mas eles não chegam a ser feitos numa forja).