
Leandro Torres. Foto: Divulgação
Leandro Torres, um dos fundadores da Service IT e da Organize, vendida para a Accenture, está apostando em dois novos negócios desde que saiu da compradora, no final de 2021: a BePRO Institute e a Smart Coding Labs.
A BePRO é uma edtech focada na formação de desenvolvedores e a Smart é uma consultoria especializada no desenvolvimento de aplicações e modernização de serviços baseada na plataforma OutSystems, plataforma portuguesa de desenvolvimento low-code.
”Eu comecei a analisar minhas opções e preferi voltar a empreender. Aí a BePRO, depois a Smart, vieram como consequência natural dos aprendizados que eu fui tendo na minha carreira”, conta Torres.
O profissional tem um histórico bem-sucedido. Em 1995, participou da fundação em Porto Alegre da Service IT, hoje uma integradora com atuação nacional e uma grande parceira da IBM.
Em 2014, Torres deixou a Service IT para fundar a Organize, uma empresa especializada na plataforma de gestão de workflows ServiceNow, multinacional que então estava dando os primeiros passos no Brasil.
A Organize chegou a ser uma das maiores parceiras da ServiceNow no país, atraindo o olhar da Accenture, que adquiriu o negócio em 2020, colocando Torres como líder na prática, onde o profissional permaneceu até 2021, um arranjo comum em aquisições.
Após dois meses em casa, o empreendedor começou a analisar o que gostaria de fazer e percebeu que a área de formação de pessoas era algo no qual tinha prazer em atuar, além do nicho apresentar uma demanda cada vez maior.
“Os números estão aí para mostrar, seja pela evasão de pessoas qualificadas para fora país, por empresas que não conseguem preencher os seus níveis mínimo-médios de profissionais ou prognósticos de falta de profissionais na área de TI no Brasil e no mundo”, explica Torres.
Baseado nisso, a primeira a surgir foi a BePRO Institute, uma edtech especializada na formação de talentos para a área de desenvolvimento de sistemas, especialmente no nível operacional de projetos de TI.
Com a proposta de treinamentos on-line gratuitos para os alunos, o público-alvo da startup são pessoas em busca de recolocação profissional ou do primeiro emprego no mercado de tecnologia.
A ideia é formar rapidamente, com base em metodologias ágeis, profissionais juniores para vagas com salário inicial de até R$ 3 mil mensais.
“Existe, às vezes, uma miopia que eu vejo nas empresas. A gente vê muita vaga de sênior. Só que, sinceramente, não tem nenhum sênior se o cara não for júnior antes. É a base. Nosso foco é adicionar gente na base da pirâmide e, com o tempo, essas pessoas vão escalando salários melhores à medida que vão pegando experiência e certificações”, explica Torres.
Para ser selecionado, o aluno precisa estar cursando ou ter cursado alguma disciplina relacionada à área de TI e ter conhecimento básico de inglês.
Na primeira turma, que teve início em abril deste ano, mais de 150 pessoas se candidataram e 26 participaram efetivamente da formação focada na plataforma Outsystems. Até o final do ano, a expectativa é formar 800 novos desenvolvedores.
O treinamento tem 140 horas e dura quatro semanas, com todas as 68 aulas gravadas, englobando conteúdo técnico e comportamental.
Na prática, o curso simula um projeto de implementação. No começo de cada manhã, é feita uma reunião para esclarecer as dúvidas do dia anterior, depois os alunos assistem aos vídeos. À tarde, mais uma reunião de meia hora. No final da semana, há também uma sessão de perguntas para revisão.
Na última semana, é feito o desafio final, com a criação de aplicações em cima da plataforma trabalhada.
Os alunos que completam as aulas e fazem com sucesso o desafio, recebem o certificado. A partir disso, a proposta é já encaminhá-los para o mercado de trabalho.
Para colocar essa engrenagem em funcionamento, o empresário investiu R$ 550 mil.
“Eu sou cliente da OutSystems, assinei a plataforma para poder criar todos os sistemas que nós usamos da BePRO. Nós também contratamos uma empresa para gravar todos os vídeos no estúdio, além da professora Lucia Helena Galvão, de Filosofia, para gravar aulas”, detalha Torres.
Hoje, a ideia de estruturação da edtech é ter uma pessoa responsável pela vertical de OutSystems. Se, no futuro, houver aulas de outras plataformas, como Salesforce, por exemplo, haverá uma outra pessoa só pra cuidar disso.
Para o futuro, a perspectiva é que os fabricantes cedam o material oficial. Na outra ponta, as empresas interessadas em contratar mão de obra entrarão com o patrocínio dos cursos. O valor é de R$ 6 mil por treinamento e, se o cliente contratar mais de 10, fica em R$ 5 mil.
“A formação dos talentos também é trabalho das contratantes. Existe um gap e nós vamos ver muita mudança nesse setor da educação com a entrada de mais capital privado para investir na formação das pessoas que elas mesmas precisam. E o fabricante também tem interesse porque ninguém compra uma tecnologia que o ecossistema não cresce”, explica Torres.
Daqui para frente, a meta da edtech é recuperar o investimento inicial, pagar as contas e, se sobrar algum dinheiro, investir mais no negócio.
“Eu vou te confessar que eu não abri a Bepro para ser um bom investimento. Tem um cunho social. Nós deixamos um valor assim só para pagar as contas mínimas”, revela Torres.
Para o empresário, situações como a recessão econômica, demissões em companhias de tecnologia e a existência de outras edtechs do tipo não são entraves.
“Essa necessidade de ter bons profissionais não vai parar nunca. A tecnologia é uma forma das empresas continuarem prosperando mesmo em situações de crise. Pode ver que ninguém demite engenheiro de software, desenvolvedor, área de inovação. Tu não vê demissões desse tipo de profissional”, opina Torres.
O CAMINHO ATÉ A SMART
Após criar a BePRO e, por consequência, entrar mais no universo OutSystems, o empresário foi convidado pela fabricante a empreender novamente na área de serviços de tecnologia.
“A OutSystems começou o movimento de ter uma estrutura local, de criar um CNPJ no Brasil. E aí, começou a adicionar pessoas de vendas, de pré-vendas e de serviços. Então eu acabei apadrinhando esses profissionais que, na época, eram sete. A gente montou juntos a Smart Coding Lab, que hoje já está com 20 e poucas pessoas”, resume Torres.
Com isso, a nova empresa também está aproveitando algumas das pessoas formadas na BePRO. Já a edtech usa a parte de backoffice da Smart.
No novo negócio, a ideia é ter a OutSystems como único fabricante parceiro, como era no caso da Organize, sua antiga companhia, que trabalhava exclusivamente com a ServiceNow. Para Torres, abrir muito o leque de fabricantes acaba gerando um desvio de foco.
“Na Service IT Solutions (outra empresa fundada por Torres), a gente tinha uma estratégia de trabalhar com vários fabricantes, até porque eu trabalhava na infraestrutura de TI. A minha leitura é que isso não é tão saudável. Eu prefiro ser um parceiro super focado, super especializado no fabricante”, revela o empreendedor.
Para o empresário, um fator levado em consideração foi a vantagem da Outsystems ter clientes de todos os tamanhos e segmentos, apesar do foco da Smart ser mais em médias e grandes.
“Nós temos um cliente, por exemplo, que é a Adami, em Santa Catarina, que trabalha com celulose e comprou só para a gestão florestal. E tem clientes como a Petrobras, que comprou e licitou R$ 600 milhões de serviços em OutSystems. Então, tem os dois. Tu consegue navegar bem por vários tamanhos de clientes”, exemplifica Torres.
Com um investimento de mais de R$ 1 milhão, a Smart teve início em novembro de 2022 e os colaboradores começaram a trabalhar em janeiro. Hoje, a empresa tem cinco clientes e a meta é conquistar 50 em até três anos.
“A nossa ideia nunca foi ser metralhadora, mas sim sniper. Os clientes geralmente têm problemas diferentes um do outro, então nosso foco é ouvir o que ele precisa, desenvolver aquela aplicação e depois ajudá-lo na evolução deste roadmap. Então é um trabalho mais artesanal do que um trabalho industrializado”, define Torres.
Em 2023, a meta da Smart é faturar R$ 4 milhões. A maior parte do valor deve vir de serviços e uma pequena porcentagem, de comissões.
“Nossa ideia não é fazer revenda de software. Quando tu vende um licenciamento, a OutSystems te repassa um pedacinho pequeno de comissionamento por ter ajudado na venda e pré-venda. Mas é meio irrisório frente ao faturamento de serviços”, explica Torres.