RESPOSTAS

O futuro das buscas chegou

O algoritmo entende você melhor do que você imagina.

04 de novembro de 2025 - 08:03
Cristovão Wanderley, CTO e sócio-diretor da Stratlab (Foto: Divulgação)

Cristovão Wanderley, CTO e sócio-diretor da Stratlab (Foto: Divulgação)

Os brasileiros, mais uma vez, se mostram como uma das grandes forças de early adopters no mundo da tecnologia. Não é a primeira vez que nossa velocidade de adoção chama atenção global. Fomos pioneiros em redes sociais, mobile banking e agora na inteligência artificial. Desde a popularização da IA generativa, o avanço é vertiginoso: mais de 70% dos usuários de internet no país já utilizaram alguma ferramenta de IA, e 45% das empresas afirmam ter adotado ao menos uma solução baseada nessa tecnologia, segundo levantamentos recentes do setor.

Mas isso não significa que todos fazem bom uso dela. Ainda temos um longo caminho até nos destacarmos em maturidade e estratégia.

Imagine que você está numa sala escura, procurando por algo. Pode ser uma ideia, uma resposta, um caminho a percorrer. Num passado pouco distante, os buscadores acendiam pequenas lanternas e, quando você digitava palavras-chave, eles iluminavam páginas correspondentes. Hoje, os algoritmos acendem holofotes inteiros, que reconhecem padrões, intenções, contornos antes mesmo de você saber exatamente o que perguntar. 

Essa virada é profunda. O algoritmo está aprendendo a entender o contexto melhor do que o próprio usuário. Até pouco tempo, nossa relação com os mecanismos de busca era transacional. Colocava-se, por exemplo, “melhores restaurantes SP”, recebia-se uma lista. Essa lista dependia de palavras, links, autoridade de página. O SEO tradicional (Search Engine Optimization) girava em torno de repetir termos exatos, otimizar títulos, etc.

Mas, com a chegada da IA generativa, dos modelos de linguagem e da Search Generative Experience (SGE) do Google, esse paradigma foi invertido. Os buscadores não querem mais apenas matches, querem intenção, semântica e conversa.

Prova disso é um estudo da empresa Authoritas que examinou 2.900 palavras-chave de marca e produto em 15 verticais e descobriu que, em 91,4% das consultas, o SGE exibe respostas geradas por IA, empurrando o resultado orgânico de topo para baixo da página e reduzindo drasticamente visibilidade e tráfego. Além disso, 62% dos links exibidos no SGE vêm de domínios fora do top 10 orgânico tradicional. Sinal de que o jogo mudou. A relevância semântica, e não apenas o ranking, dita as novas regras.

Outro levantamento, feito pela SE Rankings em janeiro de 2024, analisou 100 mil palavras-chave em 20 tópicos (de política a turismo) e constatou que 64% das buscas já retornavam uma resposta SGE ou ofereciam a opção de gerar uma. Ou seja, o conteúdo gerado por IA está deixando de ser uma curiosidade, já é parte central da experiência de busca.

E o Brasil, mais uma vez, está na linha de frente. Por aqui, o ChatGPT já concentra 45% de todo o tráfego de ferramentas de IA no país, refletindo um novo comportamento: menos cliques, mais respostas diretas, mais interação com a IA.

Agora, com o Atlas, o novo navegador da OpenAI, o conceito de busca dá mais um salto. O Atlas integra pesquisa, navegação e resposta conversacional em um só ambiente. Uma espécie de “buscador inteligente” que entende o contexto e apresenta a informação pronta, em vez de links a serem explorados.

E esse é o grande ponto provocativo do algoritmo. Muitas vezes, o usuário nem sabe quantas variáveis estão operando na sua cabeça, tais como tom de voz, dúvida implícita, contexto anterior, intenção de longo prazo. Um algoritmo de RSL + IA conversacional consegue captar pistas sutis, como histórico, sequência de buscas, ambiguidades, entre outros e transformar fragmentos em significado. Em uma rápida analogia, é como se antes estivéssemos entregando apenas mapas. Agora, o sistema está aprendendo a ler o terreno conosco. E, em muitos casos, nos guiando antes que possamos nos dar conta.

Entretanto, nem tudo que brilha é ouro. Quase parafraseando Ben Parker: grande poder traz grande responsabilidade. Ainda há riscos reais de desinformação e “alucinações”, mesmo em modelos avançados. O Google reconhece que o SGE segue em “fase de evolução”, especialmente em latência, precisão e utilidade.

Além disso, vale lembrar que o usuário vê pouco dos “porquês”, ou seja, porque aquele resultado foi escolhido, quais fontes foram usadas, qual o peso dado à autoridade. Isso contém risco reputacional para marcas, empresas e imprensa. Empresas com menos conteúdo bem estruturado, menos autoridade ou “vocabulário digital” rico podem desaparecer da vista, ainda que façam trabalho excelente. 

Por isso, se eu fosse dar alguns conselhos para as organizações, seria, sem dúvida, investir em conteúdo de profundidade, com semântica rica, não apenas respondendo perguntas, mas mostrando contexto. Outro ponto que merece atenção é a estrutura de dados. É preciso facilitar a linguagem para que algoritmos entendam a relevância do conteúdo, bem como adotar práticas de Generative Engine Optimization (GEO) ou, como também vem sendo chamado, AIO (Artificial Intelligence Optimization), AEO (Answer Engine Optimization) ou AI SEO. O conceito é novo e ainda sem unanimidade, mas todos apontam para o mesmo princípio: otimizar conteúdo para ser compreendido e citado por IAs. Também se faz necessário reforçar autoria, fontes, dados verificáveis. Em um mundo onde a IA pode criar “conteúdo bonito, mas falso”, confiança pode ser diferencial.

A verdade é que a busca está evoluindo de ferramenta que responde a comandos para parceira que interpreta intenções, contextos e até silêncios. Do ChatGPT ao Google SGE, passando agora pelo Atlas, estamos caminhando para uma era em que o algoritmo entende você melhor do que você imagina. Mas a ética, o julgamento e o propósito continuam sendo exclusivamente humanos. 

Ficar parado é entregar protagonismo para quem souber desenhar conteúdo pensando no invisível, no que não se diz, no que se intui, no que se sente. O futuro da busca já fala sobre humanidade, não apenas sobre palavras-chave. E quem quiser brilhar nesse novo mundo precisa acordar para isso, antes que o algoritmo o faça primeiro.

*Por Cristovão Wanderley, CTO e sócio-diretor da Stratlab Inteligência Digital, responsável por inovação, estudo de tendências de tecnologia e adoção de novas ferramentas, além de desenvolver estratégias de negócio por meio do marketing digital. É especialista em análise de dados para que informações sejam traduzidas em ações que resultem em aumento de ROI, receita e geração de leads. Formado em Design Gráfico pela Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP) e com especialização em MKT, Comunicação, Gestão de Mídias Sociais, DMB, Digital Transformation & Big Data pela ESPM, tem ainda larga experiência em Growth Strategy, SEO estruturado para vendas e Social Selling.