MÁQUINAS

PCs de alta performance made in Passo Fundo

Razor começou como MEI de assistência técnica e, hoje, fatura R$ 20 milhões por ano.

21 de março de 2023 - 09:56
Grégory Reichert, fundador e CEO da Razor. Foto: Douglas Petry/divulgação.

Grégory Reichert, fundador e CEO da Razor. Foto: Douglas Petry/divulgação.

De assistência técnica como microempreendedor individual (MEI) até uma marca de PCs de alta performance com faturamento anual de R$ 20 milhões.

Essa é a história inusitada de Grégory Reichert, um gaúcho de 27 anos que acaba de emplacar na lista Forbes Under 30, lista de jovens brasileiros que são destaque em suas áreas, pelo sucesso da Razor, empresa fundada por ele em Passo Fundo, um pólo regional no norte do Rio Grande do Sul, em 2014.

Reichert criou a empresa com 18 anos, baseado no que tinha aprendido até então por pura curiosidade.

“Na época, meus pais e meu irmão não apoiaram muito a ideia, acharam uma maluquice. Mas depois acabaram apoiando. Aí eu fiz ‘panfletos’ em folhas A4, bem simples, dizendo que fazia serviço de formatação, assistência técnica e atravessei a principal avenida aqui da cidade aqui entregando isso de empresa em empresa”, conta o empreendedor.

Com a divulgação, Reichert conseguiu seus três primeiros clientes e o negócio foi evoluindo. Naquele mesmo ano, abriu uma loja física de 28 metros quadrados perto de uma faculdade. Em seguida, começou a revender alguns computadores.

“Apesar de ser um piá na época, eu sabia mexer em computador há um bom tempo, sabia montar, sabia fazer tudo. Aí eu pensei ‘por que em vez de só vender, só revender, por que a gente não faz?’ e aí começamos a fazer máquinas”, conta o jovem.

No começo de 2015, Grégory fez um “pitch” para André Luiz Reichert, seu irmão cinco anos mais velho, que fez um “aporte” de R$ 5 mil no negócio, usado para a criação de um e-commerce para a Razor.

Com a loja virtual, começaram a surgir pedidos para todo o Brasil e foi preciso aprender às pressas questões como tributos e logística.

No início, o empresário conta que os computadores oferecidos eram muito voltados para o universo de jogos. Ao longo do tempo, os irmãos perceberam que esse mercado estava saturado e surgiu uma demanda de vendas mais consultivas.

“Meu irmão trabalhava em um escritório de arquitetura, onde fizemos uma apresentação para um senhor com mais de 70 anos que não compreendia o porquê de gastar R$ 5 mil numa caixa preta. Mostramos porque o processador era bom, por exemplo, e ele gostou muito daquilo e resolveu comprar a máquina comigo. A partir daí, resolvemos focar mais no mercado profissional”, conta Reichert.

Lentamente, a Razor foi deixando de lado a assistência técnica e o mercado de jogos para focar no segmento profissional de alta performance. A loja de 28 metros virou uma sala de 200 metros e o negócio começou a duplicar anualmente.

“A gente começou a conseguir muita autoridade no mercado. Descobrimos que, apesar dele ser consolidado há muito tempo, os grandes fabricantes sabem vender o hardware, mas não sabem vender o computador. Eles não entendem a dor do cliente”, opina Reichert.

Com essa percepção, a Razor se especializou em um atendimento mais consultivo, começando a fabricar computadores sob medida para os clientes ainda em 2016. A partir disso, começou a atender clientes grandes, como Globo, SBT, Petrobras, Albert Einstein e Butantan.

“Muitas vezes, vai um engenheiro em uma fabricante grande e compra uma máquina de R$ 30 mil, mas é uma Ferrari para andar na estrada de chão. O que fazemos é pegar a necessidade da empresa X. Se ela usa o Adobe Indesign, por exemplo, fazemos uma máquina específica para rodar aquele software”, explica o empresário. 

Apesar de André, irmão de Grégory, ter participado do negócio desde o início, foi em 2017 que ele deixou o emprego como arquiteto e passou a trabalhar exclusivamente na Razor, onde hoje é Chief Operating Officer (COO). 

“Temos uma dinâmica bem interessante, porque eu sou um cara mais sonhador. Eu acho que tudo é possível e o André é um cara mais pé no chão, então é uma relação muito boa de um meio termo. A gente brinca que, se eu conseguir vender a ideia para ele, eu vendo para qualquer um”, conta Grégory.

Em 2019, a Razor foi acelerada pela Endeavor Scale-up, onde teve mentorias com fundadores de companhias como 99, Terra, GetNet e Rocket Chat. Na época, a gaúcha tinha uma equipe de 15 pessoas.

No final de 2020, a empresa levantou R$ 1,8 milhão em três dias na plataforma de crowdfunding Kria, em uma captação com 150 pessoas. No ano seguinte, vieram mais R$ 4,4 milhões com 480 investidores. Juntas, essas pessoas detêm uma fatia de 16% do negócio. O restante é dos dois irmãos.

Como todo o mercado, nos últimos anos, a Razor também vem enfrentando a escassez do fornecimento de chips vindos da China. Para Grégory, o problema só deve ser reduzido no final de 2023 ou início de 2024.

O empresário conta que, anteriormente, conseguia comprar processadores a prazo muitas vezes e, hoje, precisa pagar quase tudo à vista — considerando a baixa oferta de fornecedores para a alta demanda de compradores.

“Como trabalhamos sob demanda, não temos estoque. Um cliente comprava comigo e pedia uma placa de vídeo X, eu vendia e, quando ia comprar o processador, não tinha mais. Aí o pedido, que já demoraria 60 dias, às vezes demorava entre 120 e 150 dias para ser entregue e acabava sendo um grande problema para a Razor”, conta Reichert.

Nesse contexto, a companhia também concorre com gigantes que acabam sendo priorizadas, como a Dell, por exemplo, que representa cerca de 40% do faturamento da Intel. 

“Mesmo com essa situação de escassez, que começou em 2020, conseguimos duplicar de tamanho em 2020 e também em 2021. Então, mesmo com todas as adversidades, a gente conseguiu continuar crescendo”, destaca o empresário.

Em 2019, a empresa faturou R$ 5 milhões, cifra que chegou a R$ 10 milhões em 2020 e a R$ 22 milhões em 2021. No ano passado, a receita ficou em R$ 20 milhões e, em 2023, o objetivo é retomar o ritmo de crescimento, chegando a R$ 40 milhões.

Para chegar à meta, a companhia planeja o ingresso em novos segmentos, como o de notebooks, já que hoje é voltada a workstations. Os primeiros laptops já foram desenvolvidos. Outro mercado em vista é o de locação de equipamentos para outras empresas.

Atualmente, a Razor também busca aportes com fundos internacionais, pois nunca conseguiu muita conversa com os nacionais. O motivo seria um foco maior em Software as a Service (SaaS) no Brasil, o que deixa os negócios de hardware um pouco de lado. 

Toda a estrutura administrativa e de fabricação da companhia continua em Passo Fundo, hoje com cerca de 50 funcionários. 

“No começo, eu achava um problema muito grande não estar em uma capital, mas, se a Razor tivesse nascido São Paulo, por exemplo, talvez seria uma assistência técnica até hoje. Eu teria muita demanda, então não precisaria mudar de negócio. A gente mudou porque Passo Fundo é uma cidade de 200 mil habitantes, não tem uma demanda tão absurda assim”, pontua Reichert.

Segundo o CEO, por ser um pólo educacional, Passo Fundo possui uma mão de obra muito especializada e, como o custo de vida é muito menor em comparação a uma capital, é possível oferecer um salário muito melhor do que o regional sem custar tanto.

Além disso, a empresa conseguiu incentivos fiscais atrelados aos recebidos pela Dell na sua instalação no Rio Grande do Sul, por ser da mesma área.