Mercado Livre é centro de disputa entre sindicatos. Foto: Divulgação.
O Sindpd, sindicato de profissionais de TI de São Paulo, acionou o Mercado Livre na Justiça do Trabalho por descumprimento da Convenção Coletiva de Trabalho.
A acusação se refere à MeLi Developers Brasil, uma empresa de desenvolvimento de software ligada à gigante de e-commerce.
A MeLi aderiu a uma convenção coletiva negociada pelo Sindicato dos Trabalhadores nas Empresas e Cursos de Informática do Estado de São Paulo (Sindiesp) com o Sindicato de Empresas de Internet do Estado de São Paulo (Seinesp).
Na visão do Sindpd, a convenção coletiva que deveria valer é assinada entre o próprio sindicato e o Seprosp, sindicato patronal paulista.
Em nota, o Sindpd explica em detalhes porque a sua convenção é mais favorável aos funcionários da MeLi.
A convenção coletiva do Sindpd, por exemplo, prevê 40 horas semanais, contra 44h do Sindiesp, além de outros benefícios.
Na ação, o Sindpd pede a condenação da MeLi ao cumprimento das normas coletivas firmadas pelo Sindpd e Seprosp, de forma retroativa, aplicáveis a todos os empregados (contratos ativos) e ex-empregados (contratos rescindidos).
Procurado pela reportagem do Baguete, o Mercado Livre disse que não foi notificado oficialmente sobre o processo, e que se manifestará “dentro dos autos”.
Ao Baguete, a empresa optou por dizer apenas que “é falsa a informação de que estaria alterando a carga horária e benefícios dos seus colaboradores de tecnologia”, sem mencionar como isso se relaciona com o acordo coletivo, que é o mote da ação do Sindpd.
Por fim, a empresa afirma que “reforça seu forte compromisso com o desenvolvimento dos seus colaboradores, assim como preza pela relação próxima e transparente com os sindicatos, que desempenham importante papel no diálogo com a iniciativa privada”.
Não se sabe qual é o tamanho do grupo de profissionais afetados. O Sindpd não chega a falar em quantidades, e o Mercado Livre nunca abriu informações sobre a MeLi Developers, se apresentando sempre como uma empresa única.
“Estamos cobrando o que é de direito dos trabalhadores. A empresa aplicou uma convenção estranha à categoria para não aplicar os direitos dos empregados. É muito grave! É a precarização da categoria profissional, prática de concorrência desleal e prática antissindical ao orientar erroneamente a representação sindical”, avalia o presidente do Sindpd, Antonio Neto.
Um aspecto interessante da disputa entre os sindicatos é que o Sindiesp faz parte da mesma família sindical do Sindpd, sendo filiado à Federação Interestadual Trabalhadores em Tecnologia da Informação, que por sua vez é filiada à Central dos Sindicatos Brasileiros.
O presidente da Central dos Sindicatos Brasileiros é... Antonio Neto, presidente do Sindpd.
A reportagem do Baguete pediu um comentário do Sindpd sobre esse aspecto da situação, mas o sindicato paulista disse que não iria falar, alegando que o problema é o desrespeito do MeLi à legislação trabalhista e não a situação dos sindicatos.
O Baguete também procurou o Sindiesp, que não se manifestou até o fechamento desta matéria.
DISPUTAS DO TIPO SÃO COMUNS
Disputas entre sindicatos para saber quem é o representante correto de uma empresa X são frequentes no ambiente sindical brasileiro.
Isso acontece porque os sindicatos buscam definir o seu público potencial nos termos mais amplos possíveis, visando aumentar a base potencial de arrecadação de contribuições.
Assim, apesar de ter no nome “empresas e cursos de informática”, o Sindiesp define na convenção coletiva a sua base de representação com uma lista enorme de atividades, que inclui “sites de leilões e lojas virtuais”, o que é uma definição bem exata da atividade do Mercado Livre.
O Sindpd, por outro lado, alega que a MeLi é uma empresa separada, cujo fim é desenvolvimento de software, o que entra na sua área de atuação.
Por outro lado, também é verdade que as empresas “escolhem” por qual sindicato patronal querem ser representadas, visando ter como contraparte um sindicato de profissionais menos poderoso, o que é claramente o caso do Sindiesp em relação ao Sindpd.
O problema para as pretensões do Sindpd nesse caso é que realmente existe uma área de sobreposição entre as esferas de representação dos dois sindicatos que pode ser complicada de separar.
A dificuldade mostra em outros casos, em tese mais simples, mas que mesmo assim se arrastam por muito tempo.
Dois exemplos clássicos são os da IBM, que se enquadra sindicalmente como uma varejista, ou a Dell, que negocia com o sindicato dos metalúrgicos de Campinas.
Maurício Renner
Editor at Baguete Diário